Só há uma lepra humana pior do que o despotismo: a cobardia. A cobardia individual ou colectiva, a que recua diante da força ou diante dos factos. De maneira singular ou plural, aberta ou encobertamente, a vida faz-nos sempre a mesma exigência: o exercício quotidiano da coragem e do risco. E quando o medo nos tolhe, e nos negamos a essa prática salutar, perdemos, como parcelas ou como soma, aquela mínima dignidade que distingue a pessoa da rês e o grupo da manada.
E o medo tolheu-nos. Por todo o país só se vêem paralíticos, seres entorpecidos, que renunciaram a viver no terreiro da claridade afirmativa e vegetam no antro da obscuridade negativa. Prudentemente fechado no seu casulo, cada qual olha o vizinho como um inimigo, a quem não fala e a quem não quer ouvir. Falar, é denunciar-se; ouvir, é comprometer-se. E só ao nível da anedota constituímos uma nação. Apenas nesse baixo plano chalaceiro dialogamos e nos sentimos irmãos.Diário X (23.09.1966)
Sem comentários:
Enviar um comentário